quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Um CLJ só pra mim.

    O CLJ não mudou minha vida, eu tenho que admitir. Mesmo depois de todas aquelas lições de vida que se aprende lá, eu continuei a mesma pessoa. Continuei brigando com a minha irmã por motivos bobos, continuei deixando meu quarto desorganizado quando minha mãe mandava limpar, continuei deixando de estudar pra ver um filme na sessão da tarde. Não sei se sou só eu, mas aquela empolgação durava umas duas semanas e sumia... Pode ser minha fraca memória, ou pode ser que o CLJ não tenha me tocado tanto assim.
   Eu adorava participar das reuniões, ás vezes era o único momento de paz da minha semana, já que quando comecei a frequentar as reuniões, passava por um momento de decisões muito importantes na minha vida! E sim, o CLJ me ajudava a relaxar, a rezar, a acreditar. E por mais que eu visse que os outros tinham problemas muito maiores que os meus, no outro dia eu já nem me importava mais com "os outros", precisava resolver os meus, porque deixar nas mãos de Deus as vezes é tão demorado, tão difícil...
   E volto a repetir... eu não via mudanças na minha vida, no meu comportamento, no meu jeito de pensar. Até duvidava de Deus muitas vezes, questionava a Bíblia, reclamava das missas. E eu não era uma adolescente rebelde, era só meu jeito de pensar.
   Mas a gente aprende com a vida não é? É engraçado porque você só vai entender as coisas quando olhar pra trás. E isso vocês vão perceber mais tarde, quando tiverem maturidade suficiente para virar de costas para a vida, parar um pouquinho e analisar tua caminhada.
   Isso eu venho fazendo a uns dois meses. Analisando a minha vida. E sério, eu passei por muita coisa em muito pouco tempo, e aí que eu fui entender o porque daquele convite em uma sexta feira chuvosa e fria (tá, o chuvosa e fria foi pra dar mais emoção).
   Eu fiz dois anos e meio de cursinho, deixei de me divertir, de ver minha família por vários meses pra poder passar no vestibular e realizar meu sonho. Fiz dezenas de vestibulares antes de conseguir passar em um. E sabem porque eu não desisti? Por causa do CLJ. Foi lá que eu aprendi que Jesus ainda não desistiu da gente, por mais que os homens não aprendam a lição nunca. Eu sei que um dia Ele vai voltar, não é assim que termina aquela música?
   Quando eu finalmente passei no vestibular, outra pedrada na cabeça. Fiquei grávida! Por descuido, por destino, quem saberá? Eu tinha tudo pra não querer ter esse filho... Tinha entrado na tão sonhada faculdade, era muito nova, tinha muito medo. Sabe quem não me deixou cometer um crime? O CLJ. Foi lá que eu aprendi que uma vida nova é uma das coisas mais lindas que existe. Não é esse o quinto mandamento? Não matar. Jesus deu a vida pelos homens, quem sou eu para tirá-la?
    Eu deixei de duvidar de Deus quando meu filho chorou pela primeira vez, eu sabia que a partir daquele momento minha vida ficaria extremamente difícil. Não pensem que conciliar medicina e filho é fácil. Mas quando eu vi que ele tinha todos os dedinhos, duas orelhinhas e os meus olhos, eu sabia que tudo ia valer a pena.
   Hoje, quando sobra um tempinho, volto pro CLJ, só para matar a saudade. Mas confesso, não é a mesma coisa. Não é mais o meu CLJ. Tenho certeza que os manos mais velhos sentem a mesma coisa. Quem sabe é porque já aprendemos a lição. O CLJ não é mais meu, mas isso é a melhor coisa do mundo: a renovação. Uns saem para que outros possam viver esse momento mágico de reencontro e aprendizado. Por isso eu só tenho um conselho pra vocês: façam o CLJ de vocês, do jeito de vocês. Pode ser que agora Deus não faça nenhum sentido, mas quando vocês derem aquela estacionada pela vida, lembrem desse texto e olhem pra trás. Vocês vão perceber que Deus sempre esteve segurando a mão de vocês.
   Sabe, eu só quero uma coisa pro meu filho. Que ele tenha um CLJ só pra ele. Isso não vai impedi-lo de errar, de quebrar lampadas com uma bola, nem de tirar notas ruins na escola. Mas quando ele realmente precisar tomar uma decisão séria, sei que vai dar a mão para Deus.
     Mana Gabriele Zuanazzi Tonello

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O que se perde enquanto os olhos piscam.

     Alguns hão de concordar comigo. Porque móveis se chamam móveis se são imóveis? Na verdade não é sobre isso que eu quero falar. É sobre como as coisas imóveis tem vida, saem por aí, se perdem, num simples piscar de olhos. Tampa de caneta é meu maior exemplo, se abrir meu estojo não vai encontrar nenhuma. Isqueiro, caderneta, palheta, abridor de lata, documento original, guarda-chuva. Pra onde vai? Eu costumo ser organizada na medida do possível, mas algumas coisas somem. Pé de meia é um problema! Mas também qual o problema de usar um pé de cada meia? Pra onde vai o troco de moeda que a gente recebe no supermercado? O canhoto, o benjamim de tomada, o cadeado, o carregador de bateria, a cola, a extensão, rabicós, a manteiga de cacau, o óculos, as lentes de contato. Na verdade isso não vem me preocupando muito, mas é que ultimamente tenho notado uma perda muito maior, que anda atingindo a maior parte das pessoas.
    Pra onde vai a denúncia no jornal, a reclamação dos injustiçados, o reflexo inseguro, o pedido de socorro, a culpa da cópia, o bom dia da manhã, a bala que se disparou, o discurso radical?
    Pra onde vai todo nosso desalento? Todos nossos sonhos que morrem brisa e nascem tempestade? Simplicidade, prudência, a urgência do perdão andam tão sumidos...
    Aquele obrigado não dado, que a nossa má memória nem se sente culpada. Aquele beijo dado na festa, como era mesmo o nome dele? Pra onde vai aquele recado de amor que uma vez se colocava na geladeira? Pra onde vai a clareza das idéias, a busca do corpo por algo vital, a lição da queda. Pra onde foi nosso humor imoral?
   Pra onde vai toda reza interrompida pelo sono? Ela vale? São Longuinho me fale, me mostre, me dê um sinal! São Longuinho pra onde foi a coragem do meu coração? Perdemos muito piscando.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A incrível arte de matar formigas.

   Madalena mora sozinha em uma grande cidade que contêm mais carbono que oxigênio. Saiu do interior para estudar, mas a vida levou seu pai e as contas levaram o dinheiro. Com mais três irmãos para criar, sua mãe lhe deu a notícia: você precisa trabalhar Lena. Seu pai a chamava de Lena. Talvez sua mãe tenha usado o mesmo apelido para amenizar a destruição de um sonho.
   Tinha 19 anos e nenhum namorado. Na cidade grande os caras não prestam, dizia sua mãe. Lena não era feia, mas não tinha dinheiro para comprar roupas bonitas e arrumar o cabelo. Então passava despercebida onde quer que fosse, com seu velho e batido moleton cor de cinza, cor do céu da cidade, cor do fim da vida.
  Arrumou um emprego numa fábrica de inseticidas. Ela só tinha que colar o rótulo nas embalagens cinzas, da cor do seu molenton, do céu da cidade e do fim da vida. Trezentos e noventa reais por mês. Duzentos de aluguel naquele quarto imundo nos fundos de uma pensão cheia de cachorros. Noventa reais dos remédios. Lena sofria de bronquite crônica e aquele quarto úmido fazia a tosse voltar toda noite.
  Um dia Lena esqueceu o pote de margarina com açúcar em cima da mesa. Foi aí que tudo começou. Quando chegou em casa, uma fila de formigas havia se formado dentro do quarto. Lena matou uma por uma com uma faca, cortando cada pedacinho. No outro dia colocou um inseticida embaixo do casaco e foi pra casa. Esperou as formigas aparecerem e borrifou uma por uma com o veneno. Naquela noite Lena tossiu mais que o normal. No outro dia foi ao posto de sáude ver se conseguia o remédio de graça. Havia gastado o último centavo comprando doces para as formigas. Parada na fila do posto as 5 da manhã, viu um chiclete mascado jogado no chão, cheio de formigas. Saiu da fila e com a ponta do pé foi matando uma por uma. Uma compulsão. Compulsão por formigas.
   Se um psiquiatra avaliasse Lena, diria que era um jeito de se vingar pelas desgraças da vida. Mas Lena era tranquila. Sabia que as formigas não fariam falta, assim como ela. Fazia anos que não dava notícias a mãe e aos irmãos. Cinza e despercebida no mundo.
  Lena aprofundou suas técnicas de matar formigas. Roubava inseticidas mais potentes e comprava instrumentos afiados e com pontas, além dos doces que atraíam as pequenas formigas.
  Um certo dia Lena tentou matar uma formiga e ela não morreu. Lena errou o alvo e acertou sua mão, por causa da tosse. Pegou um inseticida e borrifou em seu próprio rosto. O veneno atingiu as narinas, desceu pela traquéia, brônquios, bronquíolos, até atingir os alvéolos. Lena não tossiu mais.
  Foi encontrada pela dona da pensão 12 dias depois. Cinza como sempre foi. Cinza e cheia de formigas.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Sobre endereços e passagens de ônibus...

   Em uma dessas minhas viagens semanais de 8 horas, preenchia o bilhete de passagem interestadual uns minutos antes de viajar e me ocorreu uma dúvida: qual é meu endereço? Dúvida esta, não por morar em um trailler (infelizmente), nem embaixo de uma ponte qualquer (graças a Deus), mas por estar em uma fase sem endereço fixo. De segunda a sexta (as vezes de segunda a quarta) na Rua Peru em Canoas, todas as noites de sexta a domingo na Av. Luiz Vanz e nas tardes de sabado e domingo na Av. Marechal Floriano em São José do Ouro. Pra quem reclama de tédio deve pensar: uau, isso é que é legal! Mas na verdade sinto falta da fixação!
   O homem era nômade e com a descoberta da agricultura, viu a vantagem de se fixar e cultivar a terra. Hoje é improvável pensar em viver assim, andando de um lado pro outro. Primeiro porque levar toda a bagagem seria impossível, sendo que para viajar 2 dias levo um mundo. Segundo porque as cidades seriam uma confusão só. Eu iria querer andar pelo litoral junto com 80% da população. E terceiro e talvez o mais importante de tudo: os vínculos afetivos. Na verdade o que nos faz sentir algo pelo outro é a convivência. Tudo bem que na teoria do nomadismo moderno conheceríamos um milhão de pessoas e culturas diferentes sem precisar de facebook, mas aqueles sentimentos que nutrimos por nossos vizinhos já eram. Pode ser ódio por aquele que coloca música alta quando você queria dormir, amor por aquela velhinha que sempre te da um pedaço de bolo quentinho ou atração por aquele vizinho lindo que sempre te cumprimenta no elevador. O fato é que vínculos são importantes e a convivência é a energia necessária para criá-las.
   Eu sou uma semi-nômade. Na verdade tenho três casas e vínculos multiplicados por três. Quem sabe um dia desses eu me fixo e estabeleço novos vínculos...
   Tudo por causa de uma passagem de ônibus, que eu nem lembrava mais... Detalhe que eu não preenchi o espaço do endereço e o motorista reclamou: Ah moço, eu sou do mundo!
   Falando em ônibus, eu acho que as passagens deveraim baixar de preço, mas isso é assunto pra outro dia, um dia que meu endereço for a estrada.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Um lugar para descansar os olhos.

    Na Antiguidade o trabalho era degradante, humilhante, reservado aos escravos. Naquele tempo ninguém perdia a vida tentando ganhá-la. São Tomás de Aquino chegava a recomendar o ócio. Foi no século XIX que o trabalho começou a tomar conta e se tornou um valor universal. Dezessete horas por dia, dos velhos as crianças.Com o crescimento das indústrias, trabalhar o máximo possível se tornou uma ordem. Trabalho, empresas, indústrias, produção, trabalho, lucro, lucro, trabalho, lucro, lucro. Dez anos depois se transformaram na geração PROZAC. A crise econômica não ajudou em nada. Fracassos ideológicos, fraturas nos sistemas que pareciam funcionar perfeitamente. A lista de desastres era longa, mas a mídia a resumia e o povo era aniquilado, apunhalado, sitiado por uma rede de informações, que funcionava como uma caixa de ressonância.
    Hoje o trabalho ocupa 12% de nossas vidas, quando no passado ocupava 70%. Redescobrimos o tempo livre, mas não somos livres o suficiente para viver esse tempo. Afinal, quanto tempo faz que você não fica "sem fazer nada"? Somos atingidos por um batalhão de tarefas e informações desnecessárias. Até o século XVIII a moral vinha do alto. A sociedade respeitava os valores religiosos e os "santos" ordenavam os valores a serem obedecidos e seguidos ao pé da letra. Pela primeira vez na história somos livres de preceitos religiosos. Podemos raciocinar e criar nossos próprios valores. A tão sonhada liberdade de escolher. Mas no que nos transformamos? O vazio a nossa frente é vertiginoso. Tudo é livre, aberto, mas sem alma.
   Uma época sem referências, um futuro aleatório, um nó social. A moral que vinha de cima, agora volta pelas antenas de TV, pelas redes sociais. Como decidir por nós mesmos com tal balbúrdia? Como fazer silêncio dentro de nós mesmos, redescobrir nossa sabedoria profunda, quando insistem em pregar valores globalizados que na teoria são muito bons, mas na prática... tenta pra ver. O formato televisivo molda a nossa vida: quadrada, controlada por um controle remoto e com espaço para a propaganda eleitoral. O ócio virou tédio.
    Como chegamos a esse ponto? Se não estamos trabalhando, estudando, lendo, cozinhando, limpando, não temos nada para fazer. São Tomás de Aquino deve se revirar no caixão (se é que foi enterrado num caixão). O ócio não existe mais. Um voto para a volta da preguiça! Um voto para dormir até tarde! Um voto para sentar no sofá sem precisar ligar a TV! Um voto para o NADA!
   O que na verdade tem máxima importância para a felicidade deixamos pra depois, como o recheio da bolacha, ou aquele bombom, o preferido da caixa. Mas a vida é curta. Devemos morde-la com vontade. Talvez não de tempo de comer o melhor dela.
   Precisamos descansar os olhos. Num lugar bonito, calmo, silencioso, mas cheio dos verdadeiros valores esquecidos a tempo. O melhor lugar para descansar os olhos é no olhos de outro alguém.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Isso não deveria estar aqui.

     Eu não vou ligar pra ninguém porque as pessoas tem mais o que fazer, como estudar pra prova, ver novela ou postar no facebook, do que ouvir as besteiras que eu tenho pra falar -agora não são besteiras, mas daqui a 15 minutos vão ser, como tudo que eu escrevo. Eu não tenho aula segunda feira, são 3 dias pra ficar aqui em Canoas sozinha estudando, porque eu tenho uma super provinha segunda que vem.
    Parece que foi ontem que eu olhei pelo vidro da janela a chuva caindo as cinco e meia da tarde. Uma música do Lulu Santos era a trilha sonora da abertura da malhação. Até hoje me sinto triste quando eu ouço aquela música. Esse era o horário que minha mãe chegava do trabalho. Mas ela viajava muito e as vezes não chegava no horário da malhação, nem no outro dia. Eu ficava triste mas nunca reclamava, nunca deixava transparecer minha tristeza, era fria, dura e conseguia esconder muito bem. Eu seria uma boa atriz, sério mesmo. No fundo eu sabia que era o trabalho dela, que era importante e que um filho não pode acabar com a vida de uma mãe. O filho cresce, monta sua própria vida. E a mãe? Largou o emprego, parou de estudar e agora? A vida não é mais assim, a vida é mais difícil para os filhos com mães modernas que pensam que conseguem conciliar maternidade, emprego e estudo. Pensam que conseguem. Os filhos sofrem, eu sei bem. Mas sobrevivem, talvez mais fortes que os outros, mais independentes.
    O João tem só 5 meses e eu não sei se ele sente minha falta. Eu não me lembro dessa época da minha vida e não sei se sentia tanta falta da minha mãe do que quando aprendi a pensar. Mas eu já não tenho 5 meses e sinto essa falta. Aprendi a pensar por mim mesma e são poucas as pessoas de quem eu ouço alguma opinião. Contando nos dedos: 4 pessoas. E não é por achar que a opinião das outras não é boa. Mas na maioria das vezes, o que é bom pra você, não serve pra mim. E se você acha que eu deveria ficar e estudar pra prova, que se dane você! Eu confio mais em mim do que em qualquer outra pessoa. Talvez eu fique aqui, mas isso não é o que eu quero. Eu tô mais triste agora do que quando olhava pela janela e esperava a minha mãe chegar. E eu não quero que Lulu Santos volte a cantar dentro de mim.
   Isso não era para estar aqui. Foi só um desabafo.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Dos tempos em que a calçada era macia.

     Ainda lembro de quando saí pela primeira vez com minhas amigas. Uma dessas festas de cidade pequena - mais de 50 pessoas e a festa já deu boa. Quando o cansaço batia, sentávamos na escadinha da frente do clube. A calçada parecia tão macia, tão confortável, pássavamos horas lá antes de conseguir uma carona pra aliviar a dor nos pés e o frio da madrugada. Nos domingos, a praça é que era o lugar onde todos íam. Sentávamos no encosto do banco de madeira. Uma ripinha finíssima, muitas vezes suja e quebrada. Mas era tão macia e confortável quanto a calçada da frente do clube. Ficávamos lá até o Deco mandar todos descerem e sentarem direito no banco. A praça não tinha uma folha fora do lugar. O Deco se empenhava em limpá-la, talvez por falta do que fazer, por falta de uma família presente, por falta de amor.
    Passei pela frente do clube esse final de semana. Está bonito, pintado e nem parece o mesmo. A praça está suja, cheia de folhas e copinhos descartáveis descartados na grama. Da pracinha das crianças restam 2 balanços e um escorregador. A calçada e o banco não parecem ser tão macios quanto eram antes. Mas as coisas mudam não é? O Deco morreu e as pessoas andam muito ocupadas pra prestar atenção no lixo jogado na grama da praça. Pelo menos o céu deve estar limpo, sem uma nuvem fora do lugar. Pensando bem, não sei se foram as coisas que mudaram ou se fui eu quem mudei. Porque a praça continua cheia aos domingos e os adolescentes continuam sentando no encosto do banco. Mas eu prefiro acreditar que eu não mudei. Caso contrário estaria admitindo que os bancos e as calçadas ficam duras depois dos 20. É triste quando as coisas mudam sem você perceber. Aí um dia você abre os olhos e vê que as maiores mudanças aconteceram dentro de você e consequentemente refletam lá fora.
     Quero muito que meu filho sente em uma calçada macia e confortável na madrugada fria de uma cidade pequena. Sem trânsito, sem avião, sem prédios com mais de 4 andares. Eu olho pra noite de Porto Alegre e não vejo nenhuma estrela, porque as luzes da cidade ofuscam o brilho do sol que se escondeu e que reflete nas estrelas. Tenho saudade dos tempos em que a calçada era macia.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Um dia desses...

Qualquer dia desses quero me sentar a sombra de uma árvore e repensar minha vida. Mas não aqueles pensamentos de arrependimento, de culpa, de consciência pesada. Eu quero fechar os olhos e ver as pessoas de cima. As vezes é preciso parar tudo e silenciar. Uma vida já é muito complicada, imagine várias. Eu só cuido da minha e sempre me perco, imagine quem cuida de outras. Todo mundo me pergunta: Você não se cansa de correr? Canso. Mas quando canso eu me sento, descanso, repenso. E depois de repensar, nunca mudo de idéia. Depois do descanso continuo correndo. Eu só estou vivendo. Sempre estou em dois lugares ao mesmo tempo. E a alma se suja com tanta poeira, tantas partículas soltas pelo ar. Eu cuido pra não lavar minha alma nos mesmos lugares que os outros. Não adiante lavar a alma num lugar sujo. Não adianta ir pra igreja sem fé. Não adianta caminhar infeliz pela vida. Então é preferível correr feliz. É preferível viajar toda sexta e domingo 7 horas. É preferível ficar sem dormir uma noite por semana. É preferível estudar até tarde pra poder aproveitar o final de semana. É preferível se dividir em mil pedaços pra fazer mil pessoas felizes. É preferível deixar suas coisas de lado pra jantar com os amigos e falar besteira. Por que fazendo alguém feliz, eu me sinto feliz. Os pedacinhos se juntam e eu me sinto inteira novamente. Eu junto todas as felicidades dessa vida, todos os sorrisos, todos os chorinhos de noite, todas as mamadeiras, todos os beijos de "boa noite amor" duas vezes por semana, todas as comidas da mamãe, todas as conversas de amigas e renovo minhas forças pra correr durante mais uma semana. Uma maratona sim. Mas com linha de chegada, com prêmio, medalha e uma certeza: vai valer a pena!

quarta-feira, 23 de março de 2011

Reflexões sobre o comportamento bbbdiano.

Eu não gosto de assistir bbb. Qual é a de ficar "espiando" a vida alheia? Tenho mais o que fazer. Mas o Bial fala bem a cada eliminação, motivo válido (ou desculpa) para perder tempo. Quatro finalistas agora. Um homossexual, que cuida de velhinhas, uma moça carente que não consegue dizer NÃO a um homem, um médico aparentemente sério e outra moça, digamos, normal. Quem merece ganhar um milhão? Isso me lembra uma redação que tive que escrever nos tempos de cursinho. Dez personagens a bordo de um navio. O Navio iria afundar e você era o capitão. Só cabiam 5 pessoas no barco salva-vidas. Quem você levaria? A prostituta, o padre, o político, a criança, o pai da criança, o idoso, o deficiente, o atleta, o homem de negócios e seu melhor amigo. Quem merece continuar vivendo? Tomar decisões envolve muito mais que reflexão. Envolve um medo profundo de errar, um arrependimento futuro. Ajudar a decidir quem merece um milhão de reais, mesmo que com apenas um voto, é muita responsabilidade. Na verdade, cada um de nós tem um pouco dos quatro finalistas. Quem nunca bebeu e dançou com um coqueiro, cadeira, poste ou outro objeto inanimado? Quem já resistiu aquela pessoa que sonha há anos e tem uma oportunidade? Quem nunca se mostrou sério na frente de alguém importante? Quem nunca foi normal, dormindo cedo para acordar para a aula de manhã? Decidimos o vencedor pela parte que mais gostamos de nós. Eliminamos nossos piores defeitos junto com os participantes. O bbb nada mais é do que vários eus e vocês separados, onde devemos escolher a melhor parte de nós. A nossa melhor parte pode ter nascido com a gente, pode ser pura genética ou pode ser plágio de alguém. Mostramos nossa melhor parte na frente dos amigos, na frente da câmera, no perfil do facebook. Colocamos nossa pior parte no paredão, só a deixamos solta naquele sábado chuvoso, sozinha em casa e com a porta bem fechada. Somos seres compostos. Mas nem sempre deixamos nossa composição a mostra. Só quem nos conhece por inteiro somos nós mesmo. Ninguém consegue se esconder de si mesmo. Vá na frente do espelho e olhe diretamente para seus olhos. Você sabe exatamente quem é. Qual das suas partes merece um prêmio?

quinta-feira, 17 de março de 2011

Viva seu dia como se fosse o primeiro da sua vida.

Sábado passado fui em uma formatura do curso de administração. O orador da turma, lá pelas tantas de seu discurso, começou a falar sobre morte. Não sei se foi pelo fato de dois colegas terem falecido no decorrer do curso ou por querer impressionar quem ouvia. Se fosse eu a oradora falaria em como devemos administrar nossa vida, com todas as paixões, desencontros, felicidades e dores, o maldito equilíbrio que eu não tenho. O fato é que ele leu aquela velha e conhecida frase: ''Viva seu dia como se fosse o último, um dia você acerta.'' Se pensarmos bem nessa frase, ela é meio chocante. Fico imaginando o dia em que ocorrerá o tal acerto. Será em um dia de aula de anatomia? Será que já vou ter tomado banho? Será que vou poder dar um beijo no meu filho? Será que já vou estar velhinha ao lado do meu marido dando pipoca para os pombos? Será que vou estar em uma cama de hospital com infecção generalizada? A morte é bizarra. Você está ali lendo seu livro preferido e de repente acabou. Como assim? Eu não acabei de ler o livro, ainda não viajei pra Europa, não comi ostra crua e não saltei de paraquedas. Acabou, sem mais uma chance. Fiquei pensando no que faria se soubesse o meu último dia. Com certeza não viajaria pra Europa, não terminaria a faculdade, nem leria meu livro preferido. Eu não ía conseguir fazer nada. Ía ficar esperando quietinha, em silêncio, relembrando tudo que vivi. Nem uma loja de doces eu assaltaria. Talvez um beijo nas pessoas que eu amo, mas bem discretamente. Imagine alguém chegar pra você: ''Oi, hoje é meu último dia, vim aqui me despedir.'' Eu prefiro viver os primeiros dias. Aquele frio na barriga de primeira vez, de começo de dia que você nem imagina como vai acabar. Se não der tempo de ler o livro, tudo bem, você está apenas no seu primeiro dia, tem vários pela frente. A viagem pra Europa pode esperar, a faculdade você vai conseguir acabar, sem pressa. Um beijo nas pessoas amadas sem aquela dor de despedida. Eu te amo de primeiro dia, de descoberta, de ''nossa, to apaixonada''. Nada de adeus, nada de viver o último dia.